Insubstituível
Enxerguei ela de longe, encostada
na parede e conversando com outras mulheres (provavelmente suas amigas). Ela
era linda, morena de cabelos ondulados e olhos azuis. Fiquei a observando por
alguns minutos procurando brechas pra me aproximar, notei que ela também me
olhava, mas logo desviava. Não consegui identificar o que aquilo significava. Depois
de algumas cervejas percebi que suas amigas saíram de perto e comecei a
caminhar em sua direção. Não tinha planejado o que dizer ou como encantá-la,
mas deixaria que rolasse mesmo assim.
- Está
sozinha? – Perguntei próximo ao seu ouvido. Ela levou um pequeno susto, mas
acabou sorrindo.
- Esperando
as minhas amigas.
- Posso te
fazer companhia enquanto elas não voltam?
- Pode ser –
Ela deu de ombros.
- Que tal
ir pra um lugar mais sossegado? Aqui a música está muito alta, estou ficando
com dor de cabeça, tudo bem? – Achei que levaria um fora naquele instante, mas
por incrível que pareça, ela concordou e caminhamos para a área externa da
boate. – Então, como se chama? – Perguntei ao sentarmos em um sofá.
- Jéssica e
você? – Meu coração apertou.
- Ah, que
nome lindo. Conheço uma menina chamada Jéssica também... O meu é João. João
Vitor.
- Seu nome
também é bonito – Ela sorriu.
Tentei
pensar em algo para dizer, mas o assunto realmente parecia ter acabado ali. Ficamos
em silêncio, de vez em quando eu a olhava pelo canto dos olhos e notava que ela
fazia o mesmo. Alguns minutos se passaram sem que nenhum dos dois pronunciasse
mais nada e o clima já estava ficando meio chato.
- Você quer
beber alguma coisa? – Perguntei pra quebrar o silêncio.
- Não,
obrigada – Ela me olhou e sorriu mais uma vez.
Já ia
perguntar se ela não queria a minha ajuda para procurar suas amigas, mas ela me
interrompeu antes mesmo da primeira sílaba ser formada... Com um beijo. Fiquei
sem entender, num piscar de olhos seus lábios estavam grudados nos meus sem
esforço algum da minha parte. Continuei aproveitando aquele momento por mais
alguns segundos.
- Desculpa,
mas tenho que ir – Foi tudo que ela disse, se levantou e voltou pra dentro da
boate.
Fiquei
parado por alguns minutos tentando assimilar o que exatamente tinha acontecido.
Olhei pra uma garota, cheguei nela, trocamos duas palavras, ela me beija e vai
embora? Que espécie de mulher fazia aquilo? Curioso demais pra deixar aquilo
passar sem respostas corri para procurá-la. Ela retornou ao local de início,
estava encostada e conversando com as meninas. Notei que outro cara além de mim
estava a olhando, cerca de dez minutos depois ela saiu de mãos dadas com aquele
sujeito. Quis lavar minha boca com água oxigenada pensando em quantos caras ela
tinha beijado durante aquela noite e nas noites anteriores... No mesmo instante
pensei na outra Jéssica, será que ela fazia o mesmo? Agora que não estávamos mais
juntos. Sim, por incrível que pareça, eu já namorei alguém e durou cerca de
dois anos e meio. Mas eu sempre fui assim: Festeiro e mulherengo. Durante todo
o nosso namoro eu a traí várias e várias vezes. E lógico, ela descobriu. Mas
cedo do que eu esperava, inclusive. Porém, essa história já não importa. Não vi
mais sentido em estar naquele lugar e fui pra casa, durante toda a trajetória flashbacks
me vieram na mente desses dois anos e meio.
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Era meu
aniversário de dezoito anos, acordei 13h (como de costume) e logo notei que o
espaço ao lado da minha cama estava vazio. Me despreguicei e sentei na mesma,
alguns minutos depois minha namorada entra no quarto com um pequeno bolo e uma vela
azul com o número 18 em mãos.
- Parabéns
pra você nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida... Feliz
aniversário meu amor! – Ela disse se inclinando e me dando um beijo de bom dia.
– Agora, assopre as velinhas e faça um pedido.
Agradeci e
logo em seguida fechei meus olhos com força, desejando que eu fosse solteiro
por pelo menos um dia. Abri os olhos e notei que não deu muito certo, pois ela
continuava ali com aquele sorriso contagiante.
- Agora vai
tomar um banho e se arrumar, precisamos encontrar seus pais para ir almoçar.
Comemos o bolo mais tarde – Ela disse indo em direção a cozinha.
Voltei a
deitar por mais alguns segundos e suspirei fundo, seria um longo dia. Levantei
e resolvi obedecê-la, tomando um banho e colocando uma roupa qualquer. Partimos
em alguns minutos e fomos até a casa da minha avó que preparou o almoço. É
tradição na minha família, sempre quando alguém faz aniversário é comemorado
com um almoço que reuni todos nós (até aqueles parentes que moram em cidades
diferentes). Comemos e ficamos conversando por mais algumas horas. Depois
resolvi checar o facebook e agradecer os parabéns de alguns amigos, enquanto
minha namorada enchia o saco dizendo que eu poderia fazer aquilo mais tarde.
Óbvio que eu poderia, mas não queria. Estava me divertindo bem mais vendo as
minhas fotos zoadas no meu feed do que ouvindo os mesmos papos dos meus tios e
primos. De qualquer forma o dia passou rápido e logo estava em casa. Um dos
meus melhores amigos me convidou pra ir a uma boate naquela noite, mas pra
conseguir aquilo teria que ter uma certa permissão.
- Amor,
tudo bem se eu sair com o Gui hoje? Ele me convidou pra uma festa. – Perguntei a
abraçando por trás e beijando os seus cabelos.
- Claro que
não! – Ela disse se virando pra mim e me olhando séria. – Você já saiu a semana
toda com os seus amigos, custa dar uma noitezinha pra sua namorada?
- Ah
amor... Prometo que não volto tão tarde. Só algumas horinhas, por favor – Disse
fazendo cara de cachorrinho sem dono, ela revirou os olhos e suspirou.
- Tudo
bem... Mas só algumas horas!
- OBRIGADO!
Você é a melhor! Por isso que te amo tanto – Disse a dando um longo beijo.
Mas na
verdade eu não estava indo por causa do Gui ou pela festa em si e sim por causa
da Anna Beatriz, uma garota que me deixava louco só de olhá-la. E claro, estava
com a maior intenção de fazer coisinhas a mais com ela. Me arrumei rapidamente
e esperei a minha carona, em menos de 30 minutos estávamos na tal boate. Me
aproximei da Anna Bia (como eu costumava chamá-la) e cumprimentei o resto dos
meus amigos. Ela me dava muita moral, então seria mais fácil conseguir o que eu
realmente queria. Bebemos, conversamos e dançamos por alguns minutos. Até eu me
aproximar e cochichar em seu ouvido:
- Quer dar
uma volta? – Perguntei e ela sorriu.
- Dar uma
volta? Em que sentido? – Ela respondeu maliciosa.
- No
sentido que você quiser – Respondi a provocando.
Caminhamos
até a área externa e eu a coloquei contra a parede, beijei seu pescoço causando
arrepios pelo seu corpo. E logo em seguida ataquei sua boca, agarrei sua bunda.
O clima estava ficando cada vez mais quente, estava chegando na hora de
trancá-la em um banheiro e fazer loucuras. Porém ouvi alguém soluçando de tanto
chorar, parei por alguns segundos e olhei em direção ao som... Era ela. Minha
(ex) namorada.
- Jéssica? –
Perguntei tentando assimilar se ela estava mesmo ali ou se era alucinação minha
por conta do álcool.
- Acabou
João Vitor! – Ela nunca me chamou pelo nome completo, logo em seguida correu em
direção a saída aos prantos. Tentei correr atrás, mas não a alcancei, ela já
estava dando partida no carro e sumindo de minha visão.
Peguei um
táxi e fui pra minha casa, sem me preocupar em dar explicações aos meus amigos
ou a Anna Beatriz. Encontrei-a no meu quarto colocando suas roupas dentro de
uma mochila. Tentei acalmá-la segurando em um de seus braços, mas ela estava
com raiva e não queria me ouvir.
-
Jéssica... Ao menos me escute! Não posso deixá-la sair nesse estado.
- Agora
você se preocupa? – Ela disse me encarando com lágrimas nos olhos e já com a
mochila pendurada em um de seus ombros. – E nesses dois anos e meio você fez o
que? Eu não quero ouvir as suas explicações João Vitor, porque não há nada que
me faça voltar atrás na decisão que estou tomando agora. Eu nunca proibi de
você fazer nada, sempre te amei e te coloquei como minha prioridade número um,
enquanto você saia com seus amigos e me deixava plantada aqui no seu quarto
preocupada. Mas agora chega! Já aturei demais e engoli gritos, evitei brigas e
me fiz presente em todos os teus momentos. Porém, você nunca se importou, não
é? Você não estava nem aí pra o que eu pensava ou deixava de pensar. Você nunca
se importou com os meus sentimentos. E no meio disso tudo a única coisa que
exigi de você foi sinceridade, foi fidelidade e nem isso você conseguiu
cumprir. Estou decepcionada... Não com você, mas comigo que conseguiu idealizar
alguém de um jeito tão errado. Espero que você seja feliz e que consiga fazer a
Anna Beatriz aturar o que eu aturei! – Dizendo isso ela me empurrou para o lado
e saiu do meu quarto.
Pensei em
ir atrás, mas ainda estava espantado com as suas palavras recentemente
pronunciadas. Mas logo aquela fase de reflexão passou, bati a porta com força e
gritei, xinguei Deus e o mundo. Deitei na cama e jurei pra mim mesmo que ela
era ingênua demais pra não voltar. Jurei que no dia seguinte ela bateria na
minha porta implorando pelo meu perdão. Mas ela não apareceu, nem no dia
seguinte e nem em dia nenhum.
------
Espantei
aqueles pensamentos da minha cabeça e percebi que já estava em casa. Fui direto
ao meu quarto e me deitei. Por poucos minutos comecei a sentir uma saudade
extremamente estranha daqueles dois anos. Quando assoprei as velas do meu
aniversário desejei solteirice por 24 horas e agora parecia que Deus tinha me
brindado por uma eternidade. Já havia se passado mais de um ano desde o nosso
rompimento e eu não conseguia tirá-la da minha cabeça. Sentia um frio na
barriga toda vez que alguém pronunciava o seu nome e uma dor no peito terrível.
Ainda tinha esperanças de que ela iria voltar, mas não tinha certeza se seria
pra ficar. Na noite seguinte fui á outra festa e a vi pela primeira vez depois
de um ano. Meu coração acelerou, ela estava linda. Ela tinha uma beleza que, pelo
visto, demorei a enxergar. Ainda me lembrava de quando nos conhecemos, ela era
tímida e quase nunca conversávamos, mas de certa forma me sentia estranhamente
atraído por ela. E ela por mim. Pena que o encanto durou alguns meses e logo
depois que começamos a namorar ela era apenas... Uma qualquer. Como eu estava
enganado!
- Mano! Que
mina gata! – Um dos meus recém amigos disse se aproximando com dois copos de
cerveja, um pra mim e outro pra ele.
- Qual?
- Aquela
dali – Ele apontou com a cabeça, achei que ele estava falando da melhor amiga
da Jéssica, mas não...
- A menina
de roupa rosa? – Perguntei.
- Não, há
que está de vestido branco.
Tive
vontade de voar na cara dele, mas me segurei e apenas afirmei com a cabeça. Ela
realmente era “uma mina gata”. Porém ele começou a secá-la demais e aquilo
estava começando a me incomodar.
- Posso te
perguntar uma coisa?
- Fala aí –
Ele respondeu.
- Você
acredita em amor a primeira vista?
- Mais ou
menos, por quê?
- Porque é
o que eu senti por aquela menina que você não para de olhar – Falei sério. –
Então, se você me der licença, vou chegar nela.
- Ei, eu vi
primeiro! – Ele disse me puxando pelo braço.
- Sinto
muito cara, mas aquela dali é minha. – Disse me soltando e indo em direção a
elas. – Oi, como vocês estão?
- João! –
Ela disse extremamente simpática e me cumprimentou com um beijo na bochecha. –
Quanto tempo! Estamos ótimas e você? – Estranhei, a Jéssica não costumava ser
assim “faladeira”.
- Estou
bem... Se não se importa, pode nos deixar a sós por alguns instantes? –
Perguntei ao cumprimentar a amiga dela, ela entendeu e saiu de perto. – E então,
Jessi, o que tem feito?
Começamos a
conversar por alguns minutos, eu estava nervoso sem um motivo aparente.
Convidei-a pra se sentar na área externa, mas ela negou com a cabeça.
- Por que
não? Algum problema? – Perguntei e percebi que ela ficou meio cabisbaixa.
- Áreas
externas não me trazem boas lembranças. – Ela respondeu e logo me lembrei que
foi exatamente em uma daquelas em que terminamos.
- Pra mim também não. – Pensei em trocar de
assunto rápido, mas ela me interrompeu ao abraçar outro cara.
- Oi amor –
Ela disse dando um selinho em seus lábios e nos apresentando rapidamente. – Foi
ótimo te rever João, mas preciso ir. Até qualquer dia! – Ela disse se
despedindo com outro beijo na bochecha, senti aquele local arder... De saudade.
- Foi ótimo
te rever também... Até!
Voltei ao
local onde meu amigo estava e notei que ele gargalhava sozinho. Devia estar
achando toda aquela situação muito engraçada...
- Desculpa,
mas parece que ela já tem dono – Ele disse rindo e logo se afastou.
Fiquei
parado ali, sem me mexer e cercado por pessoas desconhecidas. Ela realmente
estava seguindo em frente... Caminhei até o estacionamento e entrei no carro,
subitamente lágrimas começaram a deslizar pelo meu rosto. Era a primeira vez
que eu estava chorando por uma garota. Infelizmente não era uma garota
qualquer. Percebi que ela e o namorado também estavam ali no estacionamento, me
afundei um pouco no banco pra não ser visto. Eles se beijavam como se tivessem
se despedindo. Depois de alguns minutos ela entrou em um carro e ele entrou em
outro. Esperei com que ele desse partida e corri até o carro dela.
- Jéssica –
Bati de leve no vidro.
- Tá louco?
Você me assustou! – Ela disse rindo e abaixando o mesmo. – O que você quer?
- Queria te
fazer uma pergunta – Falei ficando sério, o que a fez ficar também.
- Claro,
pode falar.
- Me
responda com sinceridade... Você acha que eu sou capaz de ser amado outra vez? –
Ela pareceu surpresa, mas logo suspirou e começou a falar.
- Você só
será capaz de ser amado quando decidir amar, João. No meu caso eu te amei
sozinha, mas logo descobri que tudo que tínhamos não passava de uma grande
mentira. E isso vai acontecer milhares de outras vezes se você permitir que as
pessoas se apaixonem por você sem ser realmente retribuídas. Você vai viver sua
vida como uma eterna mentira, não enganando as outras mulheres, mas enganando a
si mesmo. Porque essas meninas vão crescer como eu cresci, vão arranjar outras
pessoas e serão amadas de um jeito que você nunca foi capaz de amar. Elas irão
te superar dia após dia, até o rancor elas irão esquecer e só o que vai sobrar
são as lembranças. Algumas dolorosas, outras felizes. Então sim... Acredito que
você é capaz de ser amado outra vez, mas só se você se permitir amar também.
-
Obrigado... – Disse lutando pra que mais lágrimas não caíssem. – Você me
perdoa?
- Eu te perdôo.
– Ela sorriu e meu coração acelerou. – Espero que você seja feliz e que consiga
encontrar alguém que te proporcione isso.
-
Jéssica... Só mais uma coisa, eu te fiz feliz? – Perguntei, ela suspirou
novamente.
-
Sinceramente? Não. Não do jeito que eu merecia. Eu te amei tanto, João. Você me
fez olhar nos seus olhos e acreditar em que cada palavra que dizia, isso ainda
dói bastante. Realmente espero que tu não cometa este erro outra vez. Não diga
o que não sente, está bem?
- Entendi.
Obrigado mais uma vez. Tenho certeza que se eu tivesse percebido isso antes os
nossos dois anos e meio teriam sido os melhores anos da minha vida. Mas eu não
soube aproveitar e enxergar isso, então realmente espero que aquele cara te
faça feliz. Mas se ele não fizer... Saiba que eu pretendo fazer.
- Mesmo que
não dê certo com ele, João, eu não vou mais voltar pra você. O nosso tempo já
deu, ok? Está na hora de você dar chance a outras garotas. Não vou relembrar de
quem você foi, quero me surpreender com quem você ainda será. Agora preciso ir,
já está ficando tarde. Espero ter respondido as suas perguntas de forma certa.
- E respondeu. Obrigado, boa noite! Até algum dia! – Disse acenando e me afastando do carro.
- Boa noite
pra você também! – Ela sorriu e deu partida no mesmo.
Fiquei
esperando que ela parasse o carro e corresse para os meus braços, como naquelas
cenas de filme em que tudo dá certo no final. Mas ela não fez isso e tinha
razão, o nosso tempo já deu o que tinha pra ser dado. Sempre fui alguém de
substituir as pessoas por outras. Quando não dava certo com uma menina, pegava
outra de uma aparência ou jeito parecido. E assim sempre foi. Várias vezes
troquei a Jéssica pelos amigos, pelas festas, pelas garotas que fiquei
escondido, mas nenhuma dessas vezes eu a substituí. Ela era única. Apesar de já
ter ficado com alguma outra garota com o mesmo nome, elas não tinham nada em
comum. Aliás, ninguém conseguia chegar aos pés da “minha” Jéssica. Eu sabia que
poderia substituir outras milhares de pessoas, mas ela... Ela é insubstituível.
Tanto quanto é inesquecível. E linda, nossa, como ela é linda. Eu sabia que não
encontraria outra beleza igual. Bom, parece que inverteram os papéis... Porque
agora quem estava amando sozinho era eu.
Com
amor, Letícia
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